No chão e no braço, essa foi a sensação percebida nos relatos dos monitores, agentes e brigadistas, voluntários ou contratados, que atuaram na luta contra o último incêndio de grandes proporções ocorrido no Parque Estadual Serra Verde (Pesv), situado no Bairro Serra Verde, em Venda Nova. O trabalho desses combatentes nem sempre é percebido, mas está lá ao chicotearem as chamas e ao empurrarem o calor para trás na mata que arde.
De acordo com o geógrafo Miguel F. C. Filho e a técnica em Meio Ambiente Sônia S. de Almeida Furtado, ambos monitores do Parque Estadual Serra Verde, a última queimada (do dia 17 de outubro) começou como 99% das demais, com a ação do homem — criminosa ou não.
Segundo rastreamento dos profissionais, o foco de incêndio começou próximo à cabine do Move, situada na rodovia MG-10, na divisa entre Belo Horizonte e Vespasiano, e se alastrou para a mata da unidade de conservação.
Por volta das 15h, em um ronda de motocicleta, um agente do parque avistou longe a fumaça e informou aos demais funcionários pelo rádio. Imediatamente, os brigadistas foram acionados e se deslocaram até o local das chamas. Ali começava uma batalha que duraria até as 22h30 do mesmo dia.
Na ocasião, o Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG) também foi contactado e deu apoio ao combate. Enquanto isso, voluntários da organização não governamental (Ong) “Brigada 1” e do Grupamento Civil Ambiental (GCA), da Federação Pré-Militar do Estado de Minas Gerais, já debelavam as chamas com os brigadistas da força-tarefa Previncêndio, do Instituto Estadual de Florestas (IEF).
“Não é somente a água que apaga o fogo. É sempre o combate com água associada ao processo de abafamento no chão, com sopradores, chicote e outros equipamentos”, diz Miguel.

Estima-se, conforme funcionários, que o último incêndio tenha atingido até 40% do parque, que possui 142 hectares — o correspondente a 142 campos de futebol. A média de queimadas por ano é de 30 ocorrências, e a mais grave aconteceu em 2016, no mesmo local desta mais recente, quando 80% do lugar pegou fogo. Segundo brigadistas e monitores, foram achados mortos ouriços cacheiros, gambás, filhotes de urubu, cobras e outros animais de pequeno porte.
As atividades do Pesv também são afetadas pelas queimadas. Apesar de o incêndio de outubro ter atingido uma área de refúgio e não pública, as trilhas ecológicas programadas para o mês não poderão ocorrer. “O sentimento é de luto”, diz Miguel.

Além dos gastos com a restauração da unidade de conservação, existem as despesas com os equipamentos usados no combate ao incêndio. De acordo com Miguel, um helicóptero para apoio tem a hora/voo orçada em R$4.500. No dia, foram usados por duas horas dois aviões “air tractor”, comuns na pulverização agrícola, fora os demais veículos e o suporte com alimentação.
Ex-brigadistas moradores da região também estiveram na contenção do incêndio. Para ser um brigadista florestal é necessário curso pelo estado de Minas Gerais ou nas Ongs citadas acima, as quais possuem licença. O treinamento dura em torno de um semana. Cerca de 24 pessoas brigaram na mata contra o fogo que se alastrava.

Perdas caras à natureza
Conforme Miguel, o Parque Estadual Serra Verde (Pesv) está em uma área de transição entre os biomas Mata Atlântica e Cerrado, porém, por ação do homem, uma espécie exótica de capim proveniente da África foi inserida no local. Essa vegetação cresce rápido e é mais seca que as nativas, desse modo as queimadas se alastram com maior velocidade.
Todas semanas os brigadistas e funcionários do Pesv fazem a prevenção. Quando ocorrem queimadas, a mata nativa e o capim africano são devorados pelas chamas, mas apenas a vegetação exótica volta a crescer com facilidade, o que afeta negativamente o bioma natural abafando as outras espécies.
“A equipe faz um ótimo trabalho, mas o capim (africano) gera uma ‘bola de fogo’, pois na próxima queimada existe menos mata preservada e, consequentemente, mais da vegetação invasora que ajuda a alastrar o fogo”, diz Miguel.
Outro fator complexo é que o Pesv — apesar de criado em 2007, época em que foram decretadas as desapropriações dos terrenos — ainda não foi implantado como parque porque não tem regularização fundiária, segundo seus funcionários. As indenizações aos antigos proprietários não foram disponibilizadas e existe um impasse para que o lugar tenha o investimento que precisa.
“O público que vem para cá é, na maioria, de outras cidades, enquanto as pessoas que moram do lado ainda não sabem que aqui é uma área verde preservada. O atraso da implantação do parque dificulta a relação com a vizinhança. Após isso (resolver esse problema), o parque teria toda uma infraestrutura para receber o público em geral, independente de escola ou faculdade, bem como as comunidades do entorno para terem momentos de lazer e aprendizado. Muitas pessoas achavam que quando foi criada a unidade de conservação, seria proibida a entrada. Mas não, isso aqui é para elas”, diz a monitora Sônia.
Atualmente, o efetivo do parque conta com quatro agentes, dois monitores e o gerente André Portugal. As atividades de trilhas ecológicas abertas à comunidade são organizadas mensalmente, mas existem rotinas para preservação da unidade de conservação, que é o segundo maior parque público presente em Belo Horizonte e com área totalmente interna a Venda Nova.

Iniciativas diferentes
Além dos protetores da maior área de preservação de Venda Nova, a região abriga outros projetos voltados ao meio ambiente. Bem pertinho da Estação Venda Nova do sistema Move, o espaço ambiental conhecido como “Matinha” propõe a junção entre a literatura e a natureza para promover o aprendizado e o pensamento sustentável na população. A iniciativa funciona na Rua Água Marinha, 120, no Bairro Candelária.
Aberto ao público de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, a Matinha tem a coordenação de Flávia Melo, doutoranda em Ciências da Informação pela UFMG. A dinâmica conta com a participação de um jardineiro. Ele ensina as crianças e jovens a cultivar e cuidar das hortas. Elas passam por uma palestra e por uma atividade prática, na qual os alunos preparam a terra e plantam as espécies.
Ao final da interação, o plantio pode ter três destinos: as casas dos alunos, a escola ou permanecer no Espaço Ambiental de Venda Nova. Só no ano passado e em 2017, a iniciativa apresentou o pensamento sustentável a cerca de 3,3 mil estudantes de Venda Nova e região, a partir de 173 atividades promovidas.
“Muitas escolas de Venda Nova, principalmente as Emeis, têm optado por construir uma horta. Geralmente, elas nos procuram para conseguir orientação ambiental e tirar os alunos um pouco da rotina de sala de aula”, conta a coordenadora Flávia Melo, que está no projeto há pouco mais de um ano.
A Matinha existe desde 2008 e foi idealizada pela ambientalista Cláudia Barros. O terreno pertencia a gerência de jardins de Venda Nova, porém o órgão não existe mais.
Além dos atendimentos às escolas, a Matinha oferece serviços à população de Venda Nova. O espaço abriga uma biblioteca, na qual o cidadão pode escolher um livro e lê-lo em um local calmo, preservado e longe da correria do dia-dia.
Outra novidade ressaltada pela coordenação é a ‘Sementioteca’. Trata-se de um inventário com diversas sementes. Nele, o visitante pode aprender um pouco mais sobre espécies conhecidas do seu cotidiano, como unha de vaca, jatobás, ipês etc.

O cuidado com a fauna e a flora também chama a atenção. Por se tratar de um ambiente localizado no perímetro urbano, a Matinha ostenta uma singularidade: um dos últimos espaços do bioma Cerrado ainda não desmatado em Belo Horizonte.
Parcerias com o Projeto Manuelzão, da UFMG, também fazem parte do cronograma. São palestras com ambientalistas e veterinários do programa, que passam informações em prol de uma vida mais harmoniosa com o meio ambiente.
Outro local voltado ao meio ambiente em Venda Nova é o Centro de Vivência Agroecológica (Cevae) do Bairro Serra Verde. Vinculado à prefeitura, o órgão promove agricultura familiar e compostagem junto à população da região. Toda a plantação, que inclui folhas usadas na alimentação e ervas medicinais, é voltada ao Serra Verde. Há, ainda, a produção de adubo sustentável (compostagem) e promoção de atividades culturais e esportivas para a comunidade.
Com objetivo semelhante, a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) executou mudanças na coleta seletiva da cidade. Saíram os Locais de Entrega Voluntária e entraram os Pontos Verdes, que já podem ser vistos na Rua Érico Veríssimo, no Bairro Rio Branco, em frente à Regional Venda Nova da prefeitura.
O serviço de coleta domiciliar realizado em todas as regiões da cidade não sofrerá alterações. O objetivo é instalar 200 pontos verdes até 2020, o que triplicaria a quantidade de locais de entrega voluntária existentes hoje na cidade. Neste ano, serão 77. O processo de recolhimento dos recicláveis também terá modificações, passando a ser feito de forma automática por caminhões específicos.
Além disso, o descarte dos recicláveis será facilitado, já que haverá apenas dois dispositivos para o armazenamento: um exclusivo para vidro e outro para os demais materiais que podem ser reutilizados.
